Eu andava perdido, sem objetivos ou aspirações. Os dias passavam
cinzentos por mim. Certa vez, andando pelas ruas sem destino definido,
encontrei um templo. Era muito bonito, algumas torres se erguiam dele,
até muito alto. Era alvo com detalhes em ouro e prata. Observei-o por
bastante tempo, então fui até suas portas frontais. Lá encontrava-se um
velho sentado em um banco de madeira. O velho usava roupas largas, uma
blusa com um capuz longo sobre sua cabeça. Falei-lhe:
- Olá. Tudo Bom?
Ele acenou com a cabeça. Continuei:
- Nunca tinha reparado nesse templo
Apenas silêncio.
- É muito bonito - Disse eu ao velho.
Ele pareceu se esforçar para esboçar um sorriso.
- Talvez eu volte outro dia.
Em resposta o velho acenou com a cabeça mais uma vez e eu saí dali meio sem jeito.
Nos próximos dias fui ganhando a confiança do homem. Sempre passava por
ali e o cumprimentava. Ele sempre respondia com o seu peculiar e sutil
movimento de cabeça. Em um desses dias as portas do templo estavam
abertas de par em par. Aproximei-me da entrada, o velho homem não me
dirigiu o olhar. Passei pelas portas e cheguei a um alto e amplo salão,
suntuosamente decorado. Havia arabescos, pinturas do que pareciam
espécies de divindades; algumas claras e iluminadas, outras obscuras
entre sombras. Havia também algumas estátuas dando continuidade aos
detalhes contrastantes do restante da decoração. Do outro lado desse
salão, vi uma porta , a única passagem existente além da entrada
principal. Fui até essa porta e acima dela notei o que parecia ser uma
inscrição em símbolos totalmente desconhecidos para mim.
Do outro lado, um senhor, muito parecido com o da entrada, disse-me:
- Este é o início do labirinto para se chegar ao altar de Deus.
- Labirinto? Mas por que um labirinto? Deus não deveria esta ao alcance de todos?
- Ele está; ao alcance de todos que estão preparados; ao alcance de todos que fizeram por merecer tal encontro.
- Como eu saberei se estou preparado?
-
Se você chegar até Deus, você está preparado. Não pŕecisa se preocupar
em procurar o caminho de volta, pois o labirinto foi construído de tal
forma que todos os caminhos que não forem corretos retornam ao início.
Começo
minha caminhada pelo labirinto. Ele é um pouco estreito, ao ponto de
duas pessoas nao poderem andar lado a lado, mas onde uma pode andar
confortavelmente. As paredes são de rocha maciça e clara, com algumas
tochas presas às paredes. Após mais ou menos 15 minutos, chego à entrada
novamente, com o velho a minha frente. Saio do templo e vou para minha
casa.
Nos dias que se seguem, continuo minha peregrinação pelo
labirinto. Alguns dias eu avançava mais, outros menos. Após alguns
meses, percebi que o labirinto também estava dividido em alguns níveis.
Não sei ao certo quanto eu precisava andar antes de chegar às escadas
que desciam ao nível seguinte, mas a impressão, era de que quanto mais
eu avançava, menor era o caminho a percorrer e mais complexo os caminhos
do labirinto. Ao início de cada novo nível, aguardava uma figura de
idade avançada, mas que era difícil dizer ao certo quantos anos tinha.
Parecia-me que tais pessoas eram sacerdotes de algum tipo, e que quanto
mais experientes eram, mais dentro do templo se encontravam. Esses
conversavam comigo a respeito dos mistérios, compartilhavam algumas de
suas experiências e, pelos corredores do labirinto, também havia alguns
iniciados que também estavam em sua busca pessoal. Cada um seguia seu
próprio caminho, pois foi-me revelado que a cada um é destinado seu
próprio Deus.
Cerca de 3 anos se passaram desde a primeira vez
que cheguei ao templo. Muitas coisas aconteceram nesse tempo, mas
finalmente chguei à entrada do altar de Deus. Apesar de tudo estar muito
cuidado e ser de grande beleza, a princípio não era nada além de mais
uma sala com suas decorações e um altar de onde se levantava uma
estátua. Caminho até a estátua e a toco. Nesse instante a estátua se
iluminou, tudo ao meu redor tornou-se brilhante até cergar-me por alguns
segundos. Tornei-me pleno de felicidade, paz, amor. Passaram-se alguns
segundos durante toda essa experiência, mas eu senti como se tivessem se
passado horas. Não houve uma conversa com palavras, foi uma conversa de
sensações, sentidos, sentimentos, um entendimento de coisas que
transcendem o próprio entender - ao menos foi o que senti. Afastei minha
mão da estátua, tudo voltara à austeridade anterior. Eu estava
extasiado. Dirigi-me à saída do templo com a certeza de que agora tudo
na minha vida seria diferente, seria perfeito.
No dia seguinte
retornei ao templo. segui instintivamente o caminho que levava a Deus.
Chegando lá, contemplei sua imagem, prolongando o momento, aproveitando
os instantes que antecediam o momento em que eu entraria em comunhão com
Ele. Então um leve brilho emanou da estátua, e uma voz ressou direto na
minha cabeça, no meu corpo:
- Volte! Você não deve procurar-me novamente. O que aconteceu ontem, aconteceu, e está feito, e é isso.
- Por quê!? O que eu fiz? Por que me abandona?
- Você possui outros deuses, outras crenças e agora deve voltar para seu amor por essas divindades.
- Mas minha dedicação é a você. Há anos. Renuncio a tudo e qualquer coisa por ti.
- Não acredito em você. Então agora parte. E você não voltará a me encontrar.
Fico desconsolado e saio completamente atordoado, sem entender os planos de Deus.
Passaram-se
dois anos desde o meu último encontro com Deus. Continuei a andar por
seus labirintos, sem nunca mais poder encontrá-lo, assim como Ele havia
me dito. Acabei por me filiar a uma outra ordem, porque era o que havia
para mim, minha vida precisava serguir e, alguns dias após minha
graduação nessa ordem, andando pelos labirintos do antigo templo,
inadvertidamente chego novamente ao altar de Deus. Não entendo bem o
porquê, sei apenas que aconteceu e, quando toquei com meu pé o chão de
sua câmara, a luz da estátua me tomou, fui em sua direçao e a toquei, e
de repente o chão sumiu, bem como as paredes, a câmara toda e o próprio
tempo. Dessa vez passaram-se horas, mas para mim foi como se tivesse
passado toda uma vida. Novamente não houve palavras, e não haveria
palavras suficientes para descrever tal "diálogo". Não foi como o
primeiro encontro, foi absurdo, foi tudo o que poderia ser e o que não
poderia também. Abro os olhos, estou no chão. A estátua ainda brilha, e
sua voz irradia através de sua luz para dentro de mim:
- Aconteceu o que teve de acontecer, e você agora deve partir.
- Não quero partir! Quero sua paz sempre comigo!
- De que maneira? Você tem outro Deus, com o qual você é comungado, para a vida toda.
-
Tu não crês em mim? Ainda não? Eu digo que renuncio a tudo, à toda essa
vida perdida e vazia, na qual eu tento inutilmente, há anos, preencher o
vazio que tu deixastes. E ainda assim, não é o suficiente? nunca será?
-
Não sei. Não está em meus planos. Faço com que as coisas sejam do modo
como acho corretas. Digo o que acho que deve ser dito. E faço o que acho
que devo fazer. Talvez não seja realmente o melhor. Mas é o que acho
mais coreto. Eu sou um Deus de compaixão, eu sinto a culpa das almas
sofridas e acolho suas dores. Você, apesar de sua dor, não precisa de
mim. Adeus.
Uma forte luz me faz fechar os olhos, quando os
abro, a minha frente está a passagem do labirinto que dá para o salão de
entrada do templo. Saio. Vou para minha casa pensando a respeito de
tudo o que aconteceu por todo esse tempo. Não entendo os planos de Deus,
mas aguardo sua luz novamente. Aguardo o dia em que sua luz brilhará
para sempre em mim e quando minha intenções parecerão verdadeiras aos
seus olhos. Continuo andando por seus labirintos, tentando encontrá-lo.
Acho injustas suas dúvidas sobre mim, mas nada posso fazer além de
continuar andando e procurando. Uma vez, um oráculo do templo me disse
que apesar de meu futuro ser incerto, ele me via encontrando Deus e nele
permanecendo. Me pergunto: estarei vivo até lá?